Aneel libera mercado de curto prazo e adia mudanças para 2014

Após um susto diante do risco de suspensão definitiva dos contratos de janeiro e fevereiro, o mercado que negocia energia no curto prazo (spot) pode se sentir mais aliviado com a decisão tomada ontem pela diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A agência autorizou a retomada das negociações na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e sinalizou com mudanças nas regras apenas em 2014. A Aneel desconsiderou a possibilidade de recontabilização dos valores para o período, a fim de evitar eventual ônus bilionário aos consumidores atendidos pelas distribuidoras. Isso poderia ocorrer se confirmado o cenário de custo da energia no mercado de curto prazo favorável às geradoras. O novo cálculo, caso fosse aprovado, seria feito com base nas capacidades de geração das usinas - recurso conhecido por "sazonalização flat" que é praticado pela usina de Itaipu. Com a recusa da proposta de repactuação dos contratos, a Aneel deu prazo de 60 dias para a área técnica iniciar estudos de aprimoramento das regras que passarão a valer no ano que vem. O relator da proposta, o diretor Edvaldo Santana, que foi voto vencido, defendeu a "sazonalização flat" para os meses de janeiro e fevereiro. Ele disse que as liquidações financeiras daquele período remetem ao repasse de R$ 1,6 bilhão aos consumidores comuns. "Esse valor representa mais de 2% de impacto da tarifa, o que não me parece ser desprezível", disse Santana. O diretor Julião Coelho ressaltou, no entanto, que qualquer avaliação sobre o impacto das liquidações de 2013 para o consumidores atendido pelas distribuidoras é "prematuro". Os diretores André Pepitone e Romeu Rufino também ressaltaram que é preciso avaliar os eventuais "ganhos" que os consumidores poderão ter até o fim do ano diante do comportamento do preço de liquidação das diferenças (PLD). As liquidações financeiras foram suspensas no instante em que o governo anunciava medidas para conter o impacto do alto custo das térmicas sobre o caixa das distribuidoras e sobre as tarifas de energia dos consumidores comuns. No dia 8 de março, um despacho da área técnica da agência proibiu a CCEE de liberar os pagamentos, estimados atualmente pelo setor em R$ 6 bilhões. A ação da Aneel veio para conter os efeitos da estratégia de geradoras que ofertaram ao mercado - através da declaração do lastro apresentada à CCEE - um volume de energia acima da garantia física de suas usinas. A decisão das empresas foi adotada quando se percebeu que a expectativa sobre o custo da energia para janeiro era de forte elevação. A sinalização clara do mercado de que o preço da energia bateria nas alturas veio, inicialmente, do quadro de escassez de água nos reservatórios das hidrelétricas. Porém, eles puderam ter certeza quando o processo de alocação de energia, previsto para dezembro, foi adiado. Em janeiro, as empresas já sabiam que o lucro estaria garantido se ampliassem o lastro de energia naquele momento. Até ontem, as entidades do setor consideravam alto o risco de a discussão parar na Justiça, levado especialmente por geradoras, comercializadoras e indústrias que poderiam sofrer com prejuízos. Há o entendimento de que decisão das geradoras, que saíram lucrando, é legítima e totalmente amparada nas leis em vigor. Portanto, qualquer intervenção da agência configuraria "quebra de contrato". A postergação do prazo de sazonalização ocorreu devido à indefinição das cotas de energia a serem destinada às distribuidoras em 2013. Isso dependia do processo de renovação antecipada dos contratos de concessão proposto pelo governo, que proporcionou o corte nas tarifas de energia este ano. Pepitone aliviou a responsabilidade da agência ao dizer que "não houve descuido" quando o órgão não agiu antes das negociações, ainda em 2012. O órgão, que já sabia dos efeitos, só se movimentou depois de receber ofício da Eletrobras. O diretor defendeu a decisão da agência ao dizer que ela preservou a "alocação de risco" praticada pelos agentes e a "estabilidade regulatória" no setor. (Rafael Bitencourt) ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Copel, Cesp e Tractebel saem ganhando. A Copel, do Paraná, a Cesp, de São Paulo, e a Tractebel estão entre as geradoras que mais vão ganhar com a venda de grandes volumes de energia em janeiro, quando os preços dispararam e superaram a marca de R$ 400 por MWh, preveem os analistas. Ontem, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu não anular as posições de compra e venda na Câmara de Comercialização de Energia (CCEE), como queria a Eletrobras, que deve amargar sozinha com um prejuízo estimado em R$ 600 milhões no primeiro mês do ano. Ontem, as ações da Eletrobras PNB caíram 3,8%, para R$ 11,06. Na outra ponta, as ações da Copel fecharam em alta de 5,6%, a R$ 29,55. Os papéis da Cesp PNB avançaram 3,8% e encerraram a R$ 20,29. A Tractebel subiu menos, 0,6%, para R$ 34,07. Como as ações da geradora já vinham apresentando um desempenho melhor, não estavam tão baratas como, por exemplo, as da Copel, afirma Márcio Loureiro, da Votorantim Corretora. "Todas as geradoras vão ganhar com a decisão da Aneel, com exceção da Eletrobras. O mercado refletiu basicamente isso", diz o analista. Na avaliação de Vladimir Pinto, do banco Bradesco, a Cemig e a Energias do Brasil também serão favorecidas, além da Copel, Cesp e Tractebel. O fato de a agência reguladora não ter alterado as regras para a liquidação dos contratos na CCEE foi elogiada pelo presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia (Apine), Luiz Fernando Vianna, e por executivos das comercializadoras. "A Aneel deu um sinal de estabilidade regulatória", disse Vianna. Segundo Christopher Vlavianos, da comercializadora Comerc, as geradoras iriam entrar na Justiça se a Aneel alterasse as regras retroativamente. "Havia um risco de judicialização, que seria muito prejudicial para o setor". Para Vianna, é cedo ainda para declarar quais serão os vencedores e perdedores. Isso só será possível no fim do ano, já que a alocação de energia é feita mês a mês pelas geradoras. Quem ganhou em janeiro (por ter vendido um volume maior) pode ficar sem energia e precisar comprá-la por um preço igualmente elevado no futuro. Regina Pimental, da comercializadora Trade Energy, diz não acreditar numa possível escassez na oferta de energia nos próximos meses. "Não vai faltar garantia física". No entanto, é provável, que os preços no mercado spot continuem elevados ao longo de todo o ano, afirma Vlavianos. (Cláudia Facchini)