Brasil desperdiça potencial de energia do lixo

País tem chance de abastecer com biogás cidade de 1,5 milhão de habitantes em duas décadas. O Brasil tem capacidade para aproveitar o metano emitido pelo lixo e gerar 282 megawatts (MW), o que equivale a levar energia a 1,5 milhão de pessoas - uma Recife inteira - em 2039. Hoje, apesar de o país ter 22 projetos de aproveitamento energético de resíduos em curso, apenas dois aterros de São Paulo já vendem energia gerada pela matéria orgânica. O prognóstico foi divulgado nesta quinta-feira pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). No Atlas Brasileiro de Emissões de Gases do Efeito Estufa e Potencial Energético, financiado pela Agência de Proteção Ambiental americana, especialistas fazem uma estimativa num horizonte de 30 anos, de 2009 a 2039. Com o avanço previsto para a destinação correta do lixo neste período, o documento aponta para a possibilidade de mitigação de emissão média anual de 29,7 milhões de toneladas de carbono na atmosfera. O diretor executivo da Abrelpe, Carlos Silva Filho, acrescenta que o Brasil já tem capacidade instalada de geração de energia do lixo orgânico de 254 MW, mas aproveita 49% deste potencial - e apenas nos aterros Bandeirantes e São João, já desativados, na capital paulista. Daqui a duas décadas, o aterro de Seropédica, na Região Metropolitana do Rio, poderá ter capacidade instalada de 25 MW, o equivalente a uma pequena central hidrelétrica. Os investimentos previstos neste aterro para viabilizar a captura do metano e sua purificação e transformação em biogás são da ordem de US$ 44 milhões. - Mostramos com este estudo que é possível gerar energia a partir do lixo orgânico. Queremos incentivar tanto o investidor quanto os órgãos de governo a gerar energia a partir do lixo, assim como houve incentivo à energia eólica. Para uma planta de 3 MW, o investimento é de cerca de US$ 5 milhões. Esta é a base.Pretendemos abrir diálogo com o governo e com investidores - afirmou o diretor da Abrelpe. A tecnologia para a instalação de microturbinas, responsáveis pela geração da energia pelo metano, vem do exterior. Mas todo o restante dos equipamentos, ou 80% da tecnologia, já é desenvolvida no Brasil, ressalta o estudo. O atlas divulgou ainda um ranking com estimativas do potencial energético por região e estado (de 2009 a 2039). O Sudeste responde por 60% do potencial nacional. São Paulo lidera com 92,4 MW, seguido por Rio (40,4 MW) e Minas Gerais (30,8 MW). O potencial da região Norte é de apenas 18 MW. - É importante que nossas autoridades percebam que os resíduos são uma fonte de energia limpa e renovável que pode contribuir para o mix energético do Brasil - ressaltou Carlos Silva Filho. Atualmente, muitos operadores de aterros sanitários optam apenas por queimar o metano transformando-o em CO2, que é 21 vezes menos nocivo à atmosfera. O Brasil ainda tenta desenvolver tecnologias mais precisas de enclausuramento de metano para evitar a fuga do gás. E só depois de aproximadamente 15 anos de vida útil de aterro é possível ter retorno energético. Para o engenheiro Walter Plácido, especialista em resíduos sólidos, faltam iniciativas de fomento dos governos: - O Brasil está quase pronto para entrar na era dos aterros bioenergéticos, com geração de energia e créditos de carbono. Mas faltam subsídios que favoreçam a venda de energia com regulamentação das bolsas do mercado de carbono. De acordo com a Abrelpe, o Brasil produziu 61,9 milhões de toneladas de resíduos domésticos em 2011. A parcela orgânica representa 51% desta fatia. Do total, 58% do lixo são destinados a aterros sanitários e adequados - outros 41,9% vão para lixões e aterros inadequados. (Emanuel Alencar)