Gasto com térmicas quadruplicará

Reservatórios têm pior nível desde racionamento; NE enfrenta maior seca em 40 anos Com os reservatórios das hidrelétricas no nível mais baixo desde 2001, quando houve racionamento, o governo vai arcar com R$ 11 bilhões este ano para manter as usinas térmicas ligadas a plena carga até dezembro e, assim, afastar o risco de falta de energia no país. O valor é quatro vezes maior do que os R$ 2,6 bilhões gastos com as térmicas em 2012 e será repassado aos consumidores, ainda que de forma diluída e só a partir do ano que vem. Segundo especialistas, a falta de chuvas até agora - principalmente no Nordeste, que enfrenta a pior seca em 40 anos - intensifica as preocupações para 2014, ano da Copa do Mundo no Brasil. ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Pouca chuva, conta alta Governo vai desembolsar R$ 11 bi com térmicas, o quádruplo de 2012. Consumidor pagará mais -RIO E BRASÍLIA- A falta de chuvas neste ano no país - principalmente no Nordeste, que enfrenta uma seca devastadora - vai fazer com que as usinas térmicas se mantenham ligadas a plena carga durante todo o ano de 2013 para gerar energia, afastando assim risco de racionamento. Só que o custo dessa operação deverá chegar a R$ 11 bilhões, conforme estimativas do governo federal, segundo uma fonte do setor. O valor é quatro vezes maior que os R$ 2,6 bilhões gastos com as térmicas em 2012. E o consumidor é quem vai pagar essa conta já a partir do ano que vem, embora de forma diluída, por até cinco anos. A situação, crítica, faz crescer as preocupações para 2014, ano da Copa do Mundo. O nível dos reservatórios das hidrelétricas está no ponto mais baixo desde 2001, época do racionamento de energia. No dia 21 de março, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), as usinas das regiões Sudeste e Centro-Oeste estavam em 49,9% da capacidade. Já as do Nordeste marcavam 42%, e as do Sul estavam em 53,1%. Embora os níveis estejam acima da margem mínima de segurança, especialistas afirmam que as térmicas continuarão funcionando a todo vapor neste ano, principalmente porque o período de chuvas termina em abril. - O nível dos reservatório chega no fim de março no pior nível desde 2001. É preocupante, pois as térmicas estão funcionando 100% desde meados de outubro de 2012 - disse Bernardo Bezerra, gerente de Projetos da consultoria PSR. O ONS revisou para baixo suas estimativas dos níveis dos reservatórios do Sudeste e Centro-Oeste para o fim deste mês. Passou de 54,20% para 52%. Por outro lado, elevou as do Nordeste, de 41,10% para 42,30%, assim como as do Sul, de 48,40% para 50,60%. O custo de R$ 11 bilhões com as térmicas é pago pelas distribuidoras de energia às usinas. Mas, para evitar que a despesa extra seja repassada às contas de luz este ano - neutralizando a prometida redução em até 18% -, o governo federal decidiu lançar mão dos recursos do encargo Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), uma taxa voltada para a universalização da energia no país. No último dia 7, a presidente Dilma Rousseff assinou o Decreto 7945, determinando o uso dos recursos da CDE para pagar os custos com as térmicas. - Foi a forma encontrada para que a redução das tarifas não fosse anulada. Algumas distribuidoras teriam uma redução de 20% nas tarifas, mas por causa das térmicas acabariam reajustando os preços em 15%. Acredito que o repasse ao consumidor começará a partir do ano que vem, diluído em cinco anos - diz Nelson Leite, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee). ANEEL DEFINE REPASSES NA TERÇA-FEIRA Mesma avaliação tem Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), do Instituto de Economia da UFRJ. Segundo ele, o consumidor vai pagar sim, mas deforma diluída, para não impactar na inflação. - Ainda não é possível calcular o valor do reajuste. O repasse da CDE para as distribuidoras de energia vai depender da necessidade de cada uma. Hoje, a CDE tem algo em torno de R$ 11 bilhões. E isso é uma vantagem para o setor elétrico, pois esse dinheiro estava parado em um fundo. Agora, será usado - afirma Nivalde. Na terça-feira, a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vai se reunir para definir a regulamentação do decreto, definindo os valores da CDE que serão repassados para cada distribuidora. Segundo Nelson Leite, somente em janeiro os gastos extras com a geração térmica foram de R$ 1,5 bilhão, contra R$ 20 milhões no mesmo mês do ano passado. O especialista lembra que as distribuidoras aguardam a regulamentação da Aneel para o pagamento dos custos da geração térmica de janeiro. Os gastos efetuados em fevereiro serão apurados até o fim deste mês. - Com pouca chuva, as térmicas vão ter que rodar o ano todo. Em relação ao ano que vem, vai depender do próximo período das chuvas, que começa em novembro - disse. Por sua vez, o presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), Reginaldo Medeiros, disse que o problema maior será mesmo em 2014, um ano crítico, na sua avaliação, se não chover no fim de 2013. - As térmicas continuam funcionando a toda carga (em 2013), porque ninguém sabe quanto de água virá - disse. O vice-presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), Cristiano Amaral, faz uma análise parecida. Segundo ele, a geração térmica vai assegurar o abastecimento no país ao longo de 2013. O recorde de consumo aconteceu em 18 de fevereiro, explicou. A partir de agora, com o fim do verão, a demanda de energia tende a cair. Segundo Amaral, os cálculos do ONS para assegurar o abastecimento do país já considera um aumento de carga (consumo) de 4% neste ano, devido ao crescimento da economia. - O risco de racionamento está distante, mas vamos ter uma energia cara - admite. O cenário ganha um contorno ainda mais dramático com os atrasos de diversas obras no setor. Segundo dados de fevereiro do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), que reúne Ministério de Minas e Energia, Aneel, Eletrobras e ONS, apenas 40% das 342 novas usinas de geração estão com o cronograma em dia. O restante está com atraso médio de oito meses. Em relação aos projetos de linhas de transmissão, só 30% dos 21.843 quilômetros estão dentro do previsto. Neste caso, o atraso médio das obras é de 13 meses. (Ramona Ordoñez e Bruno Rosa)