Governo divide com o mercado gastos com termoelétricas

O governo decidiu cobrir o rombo provocado pelo acionamento das termoelétricas desde janeiro e ainda encontrou uma forma de driblar o problema daqui para frente. As medidas mostram que os formuladores da política energética já se preparam para manter as térmicas ligadas por um bom tempo, provavelmente ao longo de todo o ano. O custo com a geração térmica precisaria ser repassado às tarifas das distribuidoras. Mas, se isso fosse feito, grande parte do corte de 15,17% promovido na conta de luz dos brasileiros a partir de fevereiro, em decorrência da renovação das concessões do setor elétrico, iria por água abaixo. A saída foi dividir as despesas com o mercado. As medidas causaram dúvidas. "O decreto saiu, mas tem uma série de pontos pendentes de regulamentação", disse o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Leite, ao Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor. As mudanças desagradaram particularmente os geradores, para os quais o governo transferiu uma parte do custo. Até agora, o Encargo de Serviço de Sistema (ESS), conta que inclui o despacho das térmicas mais caras, era totalmente bancado pelos distribuidoras e, depois, cobrado na conta de luz. "A partir do dia primeiro de abril, os compradores de energia no mercado spot pagarão por 50% desses custos, por meio de um ajuste no cálculo do preço da energia no mercado à vista ", afirma o analista do Bradesco Vladimir Pinto. Os outros 50% continuarão sendo debitados no ESS. No entanto, o encargo não mais será pago apenas pelas distribuidoras e, consequentemente, pelos consumidores. A conta começará a ser rateada, em abril, entre todos os agentes do mercado, o que inclui, além das distribuidoras, as geradoras e as comercializadoras. Para cobrir as despesas com as térmicas até março, serão utilizados recursos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que serão transferidos às distribuidoras. Embora já esperassem uma mudança no PLD, analistas e executivos não previam que isso seria feito dentro de um prazo tão curto. O PLD é fixado semanalmente pela Câmara de Comercialização de Energia (CCEE) e reflete custo da energia com base na disponibilidade de água nas hidrelétricas. O novo PLD passa a valer a partir do dia 31 de julho e vai "internalizar mecanismos que antecipam o despacho de termoelétricas para impedir que os reservatórios das hidrelétricas caiam para níveis muito baixos", explicou a CCEE. Os novos valores do PLD tendem a ser mais altos. Isso fará com que a energia no mercado spot fique mais cara para as empresas que compram uma parte do que consomem no mercado de curto prazo. Quem estiver com posições descobertas pagará mais para liquidar suas operações na CCEE. A mudança no PLD foi bem recebida pelos analistas de investimento do Bradesco e do Itaú, que consideram que o novo preço da energia será mais realista. As geradoras, porém, fizeram duras críticas. "Entendemos que houve uma intervenção do governo no mercado ", disse o presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia (Apine), Luiz Fernando Vianna. Segundo ele, os geradores sempre foram a favor de uma mudança do PLD, mas o critério não pode ser alterado no meio do jogo. "Isso causa insegurança jurídica". (Claudia Facchini, Daniel Rittner e Rodrigo Polito)