Governo teme superágio no leilão de Libra

Planalto mapeia consórcios em Libra e teme 'exagero' em leilão. Apesar da desistência de algumas gigantes petrolíferas, o governo aposta na formação de pelo menos três consórcios para a disputa do campo de Libra, no pré-sal. A avaliação oficial é que a anglo-holandesa Shell e a francesa Total têm potencial para atuar como líderes de consórcios diferentes. Segundo auxiliares da presidente Dilma Rousseff, as chinesas CNPC e Repsol Sinopec podem puxar outro grupo. Petrogal, Petronas e Mitsui são vistas no Palácio do Planalto como prováveis coadjuvantes no leilão. Existem dúvidas sobre o papel da indiana ONGC Videsh e da colombiana Ecopetrol. A Petrobras tem interesse em entrar em um dos consórcios e negocia uma forma de aumentar sua fatia em Libra. Para isso, busca uma "solução de mercado" para driblar dificuldades financeiras e pagar sua parte no bônus de assinatura, fixado em R$ 15 bilhões e que deve ser desembolsado no fim do ano. O leilão está marcado para 21 de outubro e o cronograma da Agência Nacional do Petróleo (ANP) prevê assinar o contrato em novembro. O governo trabalha com a hipótese de concorrência acirrada em torno do primeiro campo a ser licitado pelo regime de partilha, mas teme um "superágio" no leilão. Para Libra, ficou definido em 41,65% o lucro-óleo mínimo, que é a parcela da produção oferecida à União depois de deduzidos todos os gastos com atividades exploratórias. Vence quem apresentar o maior percentual. Para assessores presidenciais, é importante que o mercado não calibre de forma "errada" seus lances e evite uma oferta superando 60% de lucro-óleo, patamar a partir do qual o governo avalia que pode haver comprometimento da rentabilidade do projeto. O temor do governo é que, caso mais de 60% do petróleo seja destinado à União, o consórcio vencedor coloque o pé no freio nas atividades exploratórias e se sinta pouco estimulado a iniciar a produção em Libra. Na comparação feita por um funcionário do governo, é como um pedágio de R$ 1, no qual sobem os riscos de atrasos em obras da concessionária de uma rodovia. A aposta no Planalto é que os chineses vêm com apetite no leilão, mas não vão "rasgar dinheiro". Havia uma expectativa de que cada uma das três chinesas - a CNOOC também foi inscrita - entraria em consórcios diferentes. O edital da ANP, no entanto, deixa explícito que sociedades empresariais do mesmo grupo societário não poderão fazer ofertas diferentes pelo mesmo ativo. Com isso, pelo menos duas chinesas (com capital majoritário do governo chinês) precisam entrar juntas no leilão. A superintendente de licitações da ANP, Claudia Rabello, espera pelo menos três consórcios. Isso porque o edital da concorrência determina que cada consórcio formado para a concorrência deverá ter, no máximo, cinco empresas. A comissão especial de licitação formada para a concorrência terminou a fase de habilitação das companhias e todas as 11 inscritas poderão participar do leilão. O edital do leilão também determina que os consórcios tenham pelo menos uma empresa licitante nível A, com experiência em águas profundas, ultraprofundas, rasas e em terra. Para o leilão de Libra, estão classificadas como nível A: Total, CNOOC, CNPC, Petronas, Shell e ONGC. As licitantes nível B (com experiência em águas rasas e em terra) são Ecopetrol, Petrogal, Repsol Sinopec e Mitsui. De acordo com um assessor presidencial, a Petrobras não se contentará em ficar com apenas 30% da empresa responsável pela exploração de Libra. Esse percentual mínimo foi garantido pelo marco legal que definiu as novas regras de exploração do pré-sal, mas o objetivo da estatal seria ter uma fatia de pelo menos 40%. Para driblar as dificuldades financeiras da Petrobras, uma das possibilidades mais fortes é um acordo com outra petrolífera, pelo qual ela deixa de pagar sua parte no bônus de assinatura, mas "retribui" em óleo no futuro. Dentro do governo, no entanto, existem dúvidas sobre a motivação que parceiros no consórcio da Petrobras podem ter para permitir uma fatia ainda maior da estatal brasileira em Libra. Para as estrangeiras, o risco é perder poder de voto em decisões importantes, como a definição dos planos de exploração e do orçamento. Todas as decisões passarão pelo comitê operacional da PPSA, estatal que será a gestora dos contratos de partilha. E ela própria, conforme previsto no contrato, tem 50% de peso nas decisões do comitê. A outra metade dos votos fica com o consórcio vencedor do leilão e obedece à participação acionária de cada empresa dentro do grupo. As decisões mais importantes do comitê só podem ser tomadas com 82,5% ou 91% dos votos. Com isso, as petrolíferas estrangeiras ainda têm a certeza de que precisam estar de acordo com qualquer ato relevante no desenvolvimento de Libra. Se a Petrobras aumentar demais sua fatia no consórcio vencedor, essa blindagem fica ameaçada. Inicialmente, ela tem 15% dos votos. O governo corre para definir o comando da PPSA. O prazo-limite é novembro, quando está prevista a assinatura dos contratos. Porém, há a intenção de antecipar a indicação do presidente e da diretoria, a fim de reduzir dúvidas das empresas durante o leilão. Uma autoridade lembra um dos motivos para a pressa: a primeira reunião do comitê operacional de Libra deve ocorrer 60 dias após a assinatura do contrato. O Planalto já definiu o perfil do futuro presidente da PPSA: alguém respeitado pelo mercado, com imagem de independência e preferencialmente fora dos quadros ativos da Petrobras. Um dos sondados teria sido Jorge Camargo, consultor da norueguesa Statoil no Brasil, mas ele não teria demonstrado interesse. Na visão do governo, Libra demandará de dois a três anos de estudos do consórcio vencedor até que seja, de fato, dado início à produção. Estima-se que nos dois anos seguintes já terá sido possível recuperar entre 80% a 90% dos custos exploratórios. (Rafael Bitencourt e Daniel Rittner. Colaborou Marta Nogueira)