No limite, usinas ameaçam etanol barato

Preço competitivo frente à gasolina não deverá se repetir na próxima safra pela falta de capacidade de moagem. Unica já reconheceu o problema; Petrobras deve aumentar compra de gasolina e pressionar preços dos combustíveis. O atual preço competitivo do etanol frente à gasolina não deve se repetir na próxima safra da cana-de-açúcar (2014/2015), na avaliação de especialistas do setor. A principal causa é o risco da menor oferta do combustível em função da falta de capacidade de moagem das usinas, que já operam no limite, segundo os especialistas. Com isso, a Petrobras deve aumentar ainda mais as importações de gasolina, pressionando negativamente os preços e a inflação, e causando desequilíbrio comercial. A própria Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) já reconheceu o problema. Segundo a presidente da instituição, Elizabeth Farina, a capacidade de oferta de etanol após 2015 está "estritamente condicionada à construção de novas usinas". O investimento no setor nos últimos anos beneficiou mais a área agrícola, sem considerar a industrial. Para a safra atual, estão previstas a entrada em operação de apenas três usinas médias e o fechamento de outras 12 unidades. Além disso, a ausência de políticas para o etanol e o alto endividamento entre usineiros espantaram novos investidores no setor. Um dos reflexos é a queda na produção de máquinas e equipamentos para usinas em Sertãozinho (veja texto ao lado). "A capacidade industrial total de moagem de cana não é maior do que 700 milhões de toneladas, o que já está muito perto da quantidade esperada para a safra 2013/2014, de cerca de 650 milhões de toneladas", disse Elizabeth à Folha. Para o consultor e professor da USP, Marcos Fava Neves, os problemas surgirão já na próxima safra. A estimativa dele é que o deficit industrial chegará a 150 milhões de toneladas de cana em dois anos. "Já pode sobrar cana em 2014", disse ele. Para reverter o diagnóstico, segundo o consultor Fábio Meneghin, da Agroconsult, a decisão sobre investimentos em novas usinas tem que ser feita agora. "No entanto, o setor está em marcha lenta, sem conseguir investir", disse ele, que integra a holding Plataforma Agro, onde Marcos Jank, ex-presidente da Unica, é sócio. De acordo com dados da Unica, desde 2007, a capacidade de moagem na região Centro-Sul, a de maior produção no país, foi reduzida em 48 milhões de toneladas com o fechamento de 39 usinas desde 2007. Segundo Meneghin, as medidas tomadas até agora pelo governo --isenção de PIS/Cofins no etanol, redução de juros em financiamentos para renovação de canaviais e o aumento para 25% do etanol na gasolina-- incentivaram apenas a parte agrícola. No ano passado, os desembolsos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para a área agrícola da cana-de-açúcar cresceram 28% (para R$ 1,2 bilhão), enquanto que para a indústria caíram 44% (para R$ 2,3 bilhões). ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Ociosidade afeta outros setores em Sertãozinho. Considerada o Vale do Silício da indústria sucroalcooleira, Sertãozinho tem cerca de 250 indústrias, mas a ociosidade delas chega a 60%, segundo o Ceise BR (Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis). Por causa do ritmo industrial menor das usinas no Brasil, outros setores da economia, como o comércio e os serviços, são afetados. Segundo o presidente da Associação Comercial e Industrial da cidade, Geraldo José Zanandréa, o comércio local atravessa uma fase de poucos recursos. A fabricante de caldeiras Caldema, uma das mais tradicionais da cidade, registrou em 2013, até agora, apenas um pedido. A produção, no entanto, continua em alta por causa dos pedidos feitos no ano passado. Uma caldeira leva até 25 meses para ficar pronta. Segundo Alexandre Roberto Martinelli, coordenador comercial e de marketing da empresa, a expectativa é que o governo volte a liberar recursos para investimentos em 2014. A empresa tem 500 trabalhadores no seu quadro. (Venceslau Borlina Filho)