As fragilidades do setor elétrico brasileiro

Por Osório de Brito, da Cogen

Canal Energia - Notícias do Dia - 22/12/2016

O processo de expansão, agora, vem se baseando tanto na introdução de um parque eólico, notadamente no Nordeste, quanto na inserção de um outro, o solar, seja esse último aderente ao parque centralizado, comandado pelo ONS, seja como geração distribuída

Até recentemente o Setor Elétrico brasileiro repousava-se em um parque hidrelétrico próximo dos principais polos de consumo, localizados, ambos, no Sudeste e no Sul do país; repousava-se porque gerou-se uma rede de transmissão que permitia, além de supri-los de energia elétrica, transportar, de uma região, de elevada pluviosidade e de barramentos cheios, para outra privada de chuvas e com riscos de desabastecimento elétrico. Importa anotar que essa situação, hoje, não se alterou em sua essência mas sofreu um abalo pois as expansões desse parque foram a fio d’água, no Norte do país, afastados dos dois polos de maior consumo. Ademais, a malha de transmissão acresceu-se de significativa complexidade e o país perdeu a capacidade de reservar água; tornou-se, assim, altamente dependente de chuvas, tão dependente que, em três anos seguidos, 2013 a 2015, aproximou-se, perigosamente, de um novo racionamento, outro após 2001.

Essas adesões, embora demonstrem soluções ambientalmente benéficas, tornam o Setor cada vez mais dependente de fatores climáticos e, também, a exigir condições para enfrentar a intermitência de ambas as fontes.

Sem negar a sua importância e as suas vantagens, importa evidenciar as suas incapacidades de gerar potência para suportar as variações diárias e constantes do consumo, seja por variações de vento, seja por ausência de sol e/ou por presença de nuvens. Consequentemente, essas fontes, embora benéficas, sem uma base fixa, tornam o Setor frágil diante das oscilações do consumo, notadamente no período de ponta quando ocorre um significativo acréscimo; o enfrentamento a essa fragilidade repousa em um ou no conjunto de todos os suportes conhecidos, função de um planejamento adequado:

  • excedentes de cogeração ;
  • parque hídrico ;
  • parque térmico dotado de equipamentos apropriados diante de variações de ambas as fontes, notadamente da eólica.

Dois fatos relevantes mostram o risco provocado caso essas fragilidades não sejam combatidas:

  1. a presença marcante da fonte fotovoltaica, por exemplo, sem a devida contrapartida, pode ocasionar a situação esdruxula verificada na Alemanha, recentemente, durante o verão: sem capacidade de armazenar a energia produzida por essas fontes e, muito menos, de evitar a insolação, o Setor Elétrico alemão obrigou-se a pagar para que os consumidores consumissem energia, mesmo não as necessitando. Caso o crescimento dessa fonte não se complementar, esse risco decorrerá de uma fragilidade não enfrentada.
  2. No Nordeste, ocorre, no momento, uma predominância de um parque eólico, a exigir presença de potência; a seca está impedindo o acionamento de fontes hídricas próximas e o parque térmico instalado é inadequado para esse fim; esses fatos evidenciam um risco de “black outs” caso não se instalem seja um parque cogerador, seja um parque térmico próprio para suportar essas variações.

Outra fragilidade setorial decorre da convivência, desde o período do racionamento, ocorrido no início do atual século, com o uso de geração diesel nos horários de ponta, utilização essa própria dos consumidores optantes pela tarifa verde; essa convivência resulta do menor custo dessa utilização em relação ao preço praticado pelo Setor Elétrico nesse período, não obstante as necessidades decorrentes, entre elas o armazenamento de óleo e/ou um continuo trafegar para o seu transporte desde os locais de venda até os de seu emprego.

Na medida em que esse emprego não é registrado nas medições realizadas pela ANEEL, pois o suprimento desses consumidores o é pela geração diesel e não pelo parque centralizado e não há registro dessas instalações, o Setor, salvo algumas exceções, convive com esse suprimento, como se ele compusesse o abastecimento setorial. Contudo, essas utilizações, não sendo controladas nem pelas distribuidoras, nem pela Agencia Reguladora (e muito menos pelo ONS) dependem, exclusivamente, do consumidor seu usuário que pode desliga-lo desde que a relação existente entre o preço do funcionamento a diesel e o do Setor Elétrico inverta-se ou, então, prefira a fonte fotovoltaica ou, ainda, transfira-se para o mercado livre. Desligando-se, evidencia-se o risco de “apagões” localizados ou, então, caso seja um desligamento conjunto de vários consumidores concomitantemente, pode atingir o parque centralizado. Essa fragilidade poderia ser corrigida se o Setor os registrasse, a fim de transferir o controle do seu uso para o Setor Elétrico, especificamente para a distribuidora atingida, e, havendo gás canalizado, sua substituição por essa fonte e, ao mesmo tempo, criando condições para a instalação de uma unidade cogeradora em face de sua elevada eficiência, caso o consumidor seja possuidor das bases viabilizadoras para essa instalação.

Não há dúvidas que tais fragilidades devem estar sendo verificadas pelos planejadores e, também, pelos operadores setoriais; suas correções urgem para que, quando o país voltar a crescer e superar essa atual recessão, os riscos decorrentes sejam anulados.

Osório de Brito é engenheiro e diretor regional Rio de Janeiro da Cogen (Associação da Indústria de Cogeração de Energia)