Cogeração a gás: potencial adormecido

Fonte: Brasil Energia

O país não aproveita como deveria o potencial da cogeração de energia a gás natural, que pode agregar, segundo estimativas, até 10 GW ao sistema, gerados com aproximados mais 6 milhões de m3/dia disponíveis pelas distribuidoras para projetos que poderiam ser implementados principalmente em condomínios comerciais, hospitais e indústrias.

Pior ainda é saber que o volume consumido de gás nas plantas existentes tem até caído nos últimos anos. Segundo a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), em 2016, nas 96 usinas de cogeração a gás atendidas pelas distribuidoras no Brasil, o consumo médio teve uma retração de 5% em relação ao ano anterior: passou de 2,5 milhões de m3/d em 2015 para 2,4 milhões m³/d no ano passado.

Apesar de essa última redução ter relação com o desaquecimento da atividade industrial, segundo revela o gerente de planejamento estratégico e competitividade da Abegás, Marcelo Mendonça, trata-se da segunda queda consecutiva: em 2015 a retração no consumo médio das 90 plantas operando na época foi de 2,69% em comparação com o ano anterior.

Esse ciclo de queda, de acordo com Mendonça, precisa ser revertido para fazer valer a vocação da geração distribuída, em específico da cogeração a gás, de equilibrar a matriz energética nacional cada vez mais dependente de fontes renováveis intermitentes e, em consequência, de mais termeletricidade na base, sobretudo no momento de altas tarifas.

“O atual cenário traz desafios para o sistema. Poder contar com a exportação de energia das usinas de cogeração para a rede em momentos oportunos é muito importante”, diz. Mas para isso é necessário, continua o gerente, adaptar o sistema de precificação das usinas, normalmente condomínios em centros urbanos ou indústrias.

Um problema de desincentivo à cogeração a gás, para Mendonça, é a diferenciação que o próprio governo faz com relação às fontes renováveis dentro da geração distribuída. Prova disso seriam os valores de referência específicos publicados para as duas fontes pela Portaria 538/2016 do MME, definidos em R$ 454/MWh para a geração solar e em R$ 329/MWh para gás natural.

Embora a publicação do valor teto a ser pago pela distribuidora ao gerador tenha sido um sinal positivo para a geração distribuída, Mendonça avalia que o valor para os projetos a gás deveria ser de no mínimo R$ 500/MWh, para aproveitar a capacidade ociosa atual e incentivar novos projetos. “O valor precisaria ter como base de comparação as energias térmicas mais caras e não uma média de todas as matrizes”, avalia. O cenário de desestímulo, que tira competitividade com a geração solar distribuída, é complementado pela ausência de descontos no fio.

A esperança, porém, é que esses entraves sejam eliminados com o tempo e que a cogeração a gás entre na base do sistema energético, acredita Mendonça. Além de próxima do consumo, sua eficiência energética é superior a 95%, enquanto a usina térmica mais eficiente não chega a 60%. Isso sem falar que nunca há interrupção no fornecimento e que o desenvolvimento da matriz incentiva uma cadeia ampla de fornecedores, que inclui de fabricantes de caldeiras, de geradores, a empresas de soluções de engenharia e de operação.

Essa cadeia, por sinal, está de olho em projetos que estão em andamento ou em análise por consumidores que adotam o gás natural em seu processo produtivo.

Caso seja mais adotada no médio prazo, a região Sudeste é de longe a de maior potencial, por contar com maior malha de distribuição de gás, indústria mais importante e, principalmente, maior disponibilidade do insumo. Um recente levantamento da Associação da Indústria da Cogeração de Energia (Cogen) diz que na região há pelo menos 4,2 milhões de m3/d de gás natural que podem ser usados de imediato. Nessa conta, 2 milhões de m3 seriam da Comgás (SP), 1 milhão da CEG (RJ) e 1,2 milhão da Gasmig (MG). Para a Cogen, com esse volume se acrescenta uma carga de aproximadamente 1 GW ao sistema nacional, o que equivale a cerca de 2 GW de hidrelétricas (levando em conta o fator de capacidade médio de 54%).

Apenas no estado de São Paulo, por outro estudo da Cogen, o potencial de cogeração é de 3.500 MW, sendo 2.800 MW na indústria e 700 MW em comércio e serviços. A Comgas, aliás, afirma estar negociando 40 MW de capacidade instalada de projetos de cogeração. Um último projeto importante foi inaugurado em outubro de 2016 no centro de exposições São Paulo Expo, onde uma usina de cogeração de 6 MW passou a atender 80% da demanda por eletricidade e toda a climatização do local, por meio de chiller que aproveita o calor dos motores.

Outros estados, porém, já verificam a expansão da malha de gás, como Alagoas, que na Algás, no projeto de interiorização pelo gasoduto Arapiraca-Penedo, a segunda fase das obras teve início em fevereiro.

Em Pernambuco, a Copergás vai construir gasodutos que atenderão o interior do estado e expandir a rede de distribuição em Recife e Olinda.

Sulgás e SCGás, respectivamente em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, também farão obras para aumentar a rede de gasodutos e integrar novos clientes.